Apelação Cível nº 1030567-12.2023.8.26.0577
Espécie: APELAÇÃO
Número: 1030567-12.2023.8.26.0577
Comarca: SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
Apelação Cível nº 1030567-12.2023.8.26.0577 Registro: 2024.0000656880 ACÓRDÃO -– Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1030567-12.2023.8.26.0577, da Comarca de São José dos Campos, em que é apelante CELSO RIBEIRO DIAS, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento à apelação para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro da escritura pública, v.u.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E DAMIÃO COGAN (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).
São Paulo, 17 de julho de 2024. FRANCISCO LOUREIRO Corregedor Geral da Justiça e Relator APELAÇÃO CÍVEL nº 1030567-12.2023.8.26.0577 APELANTE: Celso Ribeiro Dias APELADO: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São José dos Campos VOTO Nº 43.483 Registro de imóveis – Escritura de compra e venda – Vendedores falecidos há mais de quarenta anos e que não possuem CPF – Óbice visando à preservação da especialidade subjetiva – Exigência afastada – Peculiaridades do caso – Certidão de casamento dos vendedores que indica que os proprietários alienaram o bem na década de cinquenta – Elementos aptos à identificação dos vendedores – Dúvida improcedente – Recurso provido.
Trata-se de apelação interposta por Celso Ribeiro Dias, contra a r. sentença de fls. 53/54, proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 1º Registro de Imóveis e Anexos de São José dos Campos, que, mantendo a exigência apresentada pela Oficial, negou o registro de escritura de compra e venda lavrada em 6 de dezembro de 1957.
Sustenta o apelante, em resumo, que "não tem legitimidade para promover a inscrição dos CPF dos vendedores", uma vez que não é parente deles e eles são falecidos; e que a certidão de casamento dos vendedores possibilita a inscrição do título. Pede a reforma da sentença para que a escritura seja registrada e, subsidiariamente, a expedição de ofício à Secretaria da Receita Federal, compelindo-a a realizar a inscrição no CPF dos falecidos vendedores (fls. 60/65).
A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 76/80).
É o relatório.
A questão que aqui se debate refere-se à qualificação dos vendedores de imóvel matriculado no 1º Registro de Imóveis de São José dos Campos. A escritura de compra e venda de fls. 10/11 foi lavrada em 1957, pelo 2º Tabelião de Notas de São José dos Campos, e nela não consta os números de RG e CPF das partes.
Afastado o risco de homonímia do comprador por meio da juntada de outros documentos, conforme narrado na suscitação da dúvida (fls. 3), insiste a Oficial que a indicação do número do CPF dos vendedores é necessária, na forma do art. 176, II, 4, "a", da Lei nº 6.015/73[1].
Ainda que a qualificação completa das partes do negócio jurídico seja, em regra, imprescindível e as normas aplicáveis sejam aquelas em vigor ao tempo da qualificação do título, a exigência, no caso concreto, há de ser afastada.
De início, deve-se destacar que a escritura apresentada a registro foi lavrada há quase setenta anos (1957 – fls. 10/11), época em que o documento solicitado pela Oficial (CPF) sequer existia.
De acordo com o título apresentado a registro, no dia 6 de dezembro de 1957, Pracidina Gomes Vieira e Benedito Geraldo, casados entre si, venderam o imóvel agora matriculado sob nº 270.946 no 1º Registro de Imóveis de São José dos Campos a João Duarte. Com algumas diferenças de grafia, a certidão de casamento de fls. 28/29 comprova que Benedito Geraldo e Placedina da Costa, que passou a se chamar Placedina Costa Geraldo, se casaram em 1º de dezembro de 1956, na cidade de São Bernardo do Campo. Havendo comprovação de que Benedito e Placedina eram casados por ocasião da celebração do negócio (casamento em 1956 e compra e venda em 1957), conclui-se que há indícios suficientes de que os proprietários do imóvel efetivamente o alienaram.
Destaque-se, ainda, que a mesma certidão de casamento (fls. 28/29) demonstra que os vendedores faleceram há mais de quarenta anos, circunstância que tornaria difícil a obtenção do número de CPF para eles, em especial se considerarmos que o apelante "adquiriu os direitos de adquirente dos direitos hereditários do imóvel,dos sucessores de João Duarte" (fls. 2). Ou seja, o apresentante do título nunca teve qualquer relação com os vendedores do bem.
No sentido de relevar a apresentação de documentos em hipóteses semelhantes, cito os seguintes precedentes deste Colendo Conselho Superior da Magistratura: "Registro de imóveis – Escritura pública de doação – Doadores não domiciliados no Brasil – CPF e CNPJ desconhecidos – Exigência afastada – Impossibilidade de cumprimento pelos apresentantes – Mitigação do princípio da especialidade subjetiva – Dúvida improcedente – Recurso provido" (CSM, Apelação n° 1039088-53.2022.8.26.0100, Rel. Des. Fernando Antônio Torres Garcia, j. em 29/6/2023). "REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de adjudicação – Promitente vendedor falecido – CPF/MF inexistente – Exigência afastada – Impossibilidade de cumprimento pelo apresentante – Princípio da segurança jurídica – Princípio da razoabilidade – Dúvida improcedente – Recurso provido" (CSM, Apelação n° 0039080-79.2011.8.26.0100, Rel. Des. José Renato Nalini, 20/9/2012).
Relevante que se destaque o seguinte trecho do último v. acórdão: "(...) Assim, para não sacrificar a segurança jurídica e a publicidade, é de rigor flexibilizar, in concreto, a severidade do princípio da especialidade subjetiva, dispensado a informação sobre o número do CPF/MF de Henri Marie Octave Sannejouand, cujo número de inscrição do Registro Geral é, de mais a mais, conhecido e consta da matrícula do imóvel (RG n.º 75.149 - mod. 19 - fls. 07), em sintonia com a carta de arrematação (fls. 23). A especialidade subjetiva, se, na hipótese, valorada com excessivo rigor, levará, em desprestígio da razoabilidade, até porque a exigência não pode ser satisfeita pela interessada, ao enfraquecimento do princípio da segurança jurídica, o que é um contrassenso. Com a exigência, o que se perde, confrontado com o ganho, tem maior importância, de sorte a justificar a reforma da sentença: a garantia registrária é instrumento, não finalidade em si, preordenando-se a abrigar valores cuja consistência jurídica supera o formalismo (...)".
Assim, diante das peculiaridades do caso e havendo elementos aptos à identificação dos vendedores, de rigor o afastamento do óbice registrário.
Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro da escritura pública. FRANCISCO LOUREIRO Corregedor Geral da Justiça e Relator NOTAS: [1]Art. 176 - O Livro nº 2 - Registro Geral - será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3. (...) II - são requisitos da matrícula: (...) 4) o nome, domicílio e nacionalidade do proprietário, bem como: a) tratando-se de pessoa física, o estado civil, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda ou do Registro Geral da cédula de identidade, ou à falta deste, sua filiação; (Acervo INR – DJe de 24.07.2024 – SP)