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Penhora de direito hereditário

Publicado em: 13/11/2025
Processo 1110905-75.2025.8.26.0100
Espécie: PROCESSO
Número: 1110905-75.2025.8.26.0100


Processo 1110905-75.2025.8.26.0100
Dúvida - Registro de Imóveis - Colégio Dante Alighieri - Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido para manter o óbice. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. - ADV: FLÁVIA HELLMEISTER CLITO FORNACIARI DÓREA (OAB 196786/SP), JOSÉ ALBERTO PEREIRA ROSSI (OAB 488547/SP), NARA DOS SANTOS PUMAR (OAB 536432/SP)
Íntegra da decisão: -– Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –
SENTENÇA
Processo Digital nº: 1110905-75.2025.8.26.0100
Classe - Assunto Dúvida - Registro de Imóveis
Suscitante: Colégio Dante Alighieri
Suscitado: 5º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo
Juiz de Direito: Dr. Rodrigo Jae Hwa An
Vistos.
Trata-se de pedido de dúvida inversa suscitada por Colégio Dante Alighieri em face do 5º Oficial De Registro De Imóveis De São Paulo - SP, alegando, em síntese, que é exequente nos autos de nº 0091756-48.2004.8.26.0100, tendo sido determinada a constrição judicial dos direitos hereditários pertencentes à executada Sônia Sapadjian Kolikiantz, em relação ao imóvel matriculado sob nº 32.979 da Serventia. Aduz que o bem integrou o acervo hereditário dos genitores da executada, cujo inventário judicial encontra-se encerrado, com expedição do competente formal de partilha, não havendo controvérsia quanto à sua condição de herdeira e proprietária do bem. Apresentou certidão expedida nos autos da execução, prenotada sob nº 407.597, a fim de averbar a penhora dos direitos hereditários da executada sobre o imóvel. Houve rejeição do registrador sob o fundamento de que o bem permanece em nome dos falecidos. Posteriormente, foi apresentado à mesma serventia um mandado determinando a averbação da existência da execução, protocolado sob a prenotação nº 415.551, novamente com nota de devolução consignando que a executada não figura como proprietária do imóvel. Tanto a averbação da penhora dos direitos hereditários quanto a averbação premonitória da execução foram obstadas pela serventia sob idêntico fundamento, qual seja, a ausência de indicação da executada como titular dominial na matrícula e a suposta ofensa ao princípio da continuidade registral. Requer a procedência da dúvida inversa para determinar ao 5º CRI que proceda à averbação da penhora incidente sobre os direitos hereditários de Sônia ou, subsidiariamente, que proceda à averbação premonitória da existência da execução.
Vieram documentos às fls. 10/59.
Houve comprovação da reapresentação do título junto à serventia extrajudicial (fls. 65).
Às fls. 75/76 e 82 houve informação de que o 5º CRI apresentou suscitação de dúvida, autuada sob número 1114119-74.2025.8.26.0100, inaugurando um novo procedimento com o mesmo objeto.
Às fls. 85/88 houve manifestação do Ministério Público pela manutenção do óbice registrário.
É o relatório. FUNDAMENTO E DECIDO.
Recebo o feito como pedido de providências.
Ainda, o feito de nº 1114119-74.2025.8.26.0100, instaurado por equívoco, foi objeto de sentença extintiva nesta data.
A par disso, cumpre ressaltar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (artigo 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.
O Oficial, quando da qualificação registral, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.
É o que dispõe o item 117, Cap. XX, NSCGJ: "Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais".
Importante destacar, ainda, que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação para ingresso no fólio real.
O E. Conselho Superior da Magistratura já decidiu que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Ap. Cível n. 413-6/7). Neste sentido, também a Ap. Cível n. 464-6/9, de São José do Rio Preto:
"Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental."
E, ainda:
"REGISTRO PÚBLICO - ATUAÇÃO DO TITULAR - CARTA DE ADJUDICAÇÃO - DÚVIDA LEVANTADA - CRIME DEDESOBEDIÊNCIA - IMPROPRIEDADE MANIFESTA. O cumprimento do dever imposto pela Lei de Registros Públicos, cogitando-se de deficiência de carta de adjudicação e levantando-se dúvida perante o juízo de direito da vara competente, longe fica de configurar ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código Penal - crime de desobediência - pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que suscitado." (STF, HC 85911 / MG - MINAS GERAIS, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, j. 25/10/2005, Primeira Turma)
Sendo assim, não há dúvidas de que a origem judicial não basta para garantir ingresso automático dos títulos no fólio real, cabendo ao oficial qualificá-los conforme os princípios e as regras que regem a atividade registral.
No caso concreto, os interessados buscam a averbação da penhora dos direitos hereditários que a executada Sônia Sapadjian Kolikiantz possui sobre o imóvel objeto da matrícula n. 32.979 do 5º Registro de Imóveis da Capital; e a averbação da existência de ação na mesma matrícula.
A matrícula acima mencionada indica que o imóvel pertence aos proprietários MANOUK SAPADJIAN, casado no regime da comunhão universal de bens (antes da Lei 6.515/1977) com MARIA SAPADJIAN (fls. 45/47).
A executada Sônia Sapadjian Kolikiantz, por sua vez, não figura na matrícula como titular de direito real do imóvel.
Segundo a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, são penhoráveis os direitos hereditários de caráter patrimonial (REsp n. 1.105.951/RJ, relator Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 4/10/2011, DJe de 14/10/2011).
Portanto, diante de uma dívida do herdeiro, é possível a penhora de seus direitos hereditários dotados de cunho patrimonial, com o fito de garantir a satisfação do débito com os bens adquiridos pelo devedor. Essa penhora, realizada no rosto dos autos do processo de inventário ou arrolamento, recai sobre o quinhão da herança, e não sobre bem específico.
No Sistema Registral, o ingresso de ordem de penhora no fólio real depende da observância do princípio da continuidade, conforme explicado por Afrânio de Carvalho:
"O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente" (Registro de Imóveis, Editora Forense, 4ª edição, p. 254).
Ou seja, a ordem, assim como o título, deve estar em conformidade com o inscrito no registro (artigos 195 e 237 da Lei n. 6.015/73):
Art. 195 Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.
(...)
Art. 237 Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro.
No mesmo sentido, o item 47 do Cap. XX das NSCGJ:
"Item 47. Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro, observando-se as exceções legais no que se refere às regularizações fundiárias".
Evidente que não apenas os atos de registro em sentido estrito devem observar o princípio da continuidade, mas também os atos secundários, de averbação, na medida em que podem originar, no futuro, registro.
Este é exatamente o caso da penhora.
A ordem de penhora, portanto, somente pode ser averbada se o devedor apontado no mandado for proprietário do imóvel ou titular de direito real.
Em termos diversos, no âmbito registral, ainda que o óbito do proprietário tenha sido averbado na matrícula do imóvel, somente após o registro da partilha será possível a averbação da penhora por dívida de herdeiro.
A propósito:
RECURSO ADMINISTRATIVO - PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - REGISTRO DE IMÓVEIS - PENHORA OFENSA AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE - RECURSO NÃO PROVIDO. (CGJ Recurso Administrativo n. 1170875-74.2023.8.26.0100 Des. Francisco Eduardo Loureiro j. 02.04.2024)
RECURSO ADMINISTRATIVO - PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - NULIDADE DAS AVERBAÇÕES DE PENHORA EM MATRÍCULA DE IMÓVEL - INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE - PENHORA PROMOVIDA EM FACE DE DEVEDORES QUE NÃO SÃO OS PROPRIETÁRIOS TABULARES - LANÇAMENTO IRREGULAR CARACTERIZADO - REFORMA DA SENTENÇA, DE OFÍCIO, QUANTO AO BLOQUEIO DA MATRÍCULA PARA AGUARDAR SOLUÇÃO JUDICIAL POR SEIS MESES - PARECER PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO ADMINISTRATIVO, COM DETERMINAÇÃO (CGJ Recurso Administrativo n. 1113070-66.2023.8.26.0100 Des. Francisco Eduardo Loureiro j. 26.03.2024).
REGISTRO DE IMÓVEIS - Penhora de direitos havidos pelo executado sobre o imóvel - Matrícula do imóvel em que o executado não figura como titular de domínio, nem como compromissário comprador - Origem judicial do título não o torna imune à qualificação registral - Divergência entre a proprietária do imóvel e titular dos direitos penhorados, que impede a averbação da penhora por violar a continuidade - Recurso não provido (CGJ Recurso Administrativo n. 1005548-43.2016.8.26.0223 Des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco j. 10.09.2019).
Na espécie, justamente pela falta de identificação do título apresentado com o conteúdo da matrícula, conclui-se pelo acerto da qualificação negativa, tudo em respeito ao princípio da continuidade regulado pelos artigos 195 e 237 da Lei n. 6.015/73.
Por fim, em relação ao pedido alternativo de averbação premonitória, que visa acautelar o credor que, por meio dos bens do devedor, poderá garantir a satisfação de seu crédito ao final da ação de execução, evitando que o imóvel seja alienado a terceiros de boa-fé, mesmo que sobre ele ainda não haja penhora incidente, também assiste razão ao Oficial.
De todo modo, para que seja possível a averbação de certidão premonitória expedida para fins do artigo 828, do Código de Processo Civil, ainda deverá ser respeitado o princípio da continuidade, conforme explicado por Afrânio de Carvalho: "O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente." (Registro de Imóveis, Editora Forense, 4ª edição, p. 254).
Ou seja, o título deve estar em conformidade com o inscrito no registro, o que não se configura no presente caso.
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido para manter o óbice.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 12 de novembro de 2025.
Rodrigo Jae Hwa An
Juiz de Direito  (Acervo INR – DJEN de 13.11.2025 – SP)


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